domingo, 16 de maio de 2010

A produção do charque e o Sopapo

O Coletivo Catarse esteve em Pelotas realizando mais gravações do documentário sobre o Tambor de Sopapo e entrevistou uma Mãe de Santo, a Tia Maruca, e a sua filha Juraci, que também é presidente da escola de samba fundada pelo Mestre Baptista há 16 anos, a Imperatriz da Zona Norte.


Tia Maruca nos contou um pouco das culturas de matriz africana, do sincretismo gerado pela opressão católica e dos rituais africanos que ajudaram os negros escravizados a suportar o campo de concentração de produção de charque em Pelotas.

Ela falou da importância do tambor ser tocado no ritual: "O tamboreiro não pode parar". Sobre o ritual de sacrífício de animais, salientou na implicância de um grande conhecimento da maneira de se matar sem gerar sofrimento para o animal, de se recolher o sangue, se retirar o couro e preparar o alimento para ser consumido depois. Os rituais de sacrifício sempre existiram, desde a mãe África, se dividindo tarefas entre as pessoas mais aptas - uma espécie de divisão do trabalho que foi também sendo utilizada nas charqueadas para a matança do gado.


Aliás, segundo Tia Maruca, matar um boi, na ritualística afrodescendente, é a maior oferenda que se pode dar a uma entidade. O sacrifício de um animal deste tamanho é muito complicado, exigindo muito conhecimento e espiritualidade, não sendo qualquer um que faz.

Neste sentido, é impossível imaginar o desenvolvimento da indústria do charque, que sacrificava 600 animais por dia, em 30 empreendimentos, sem que os envolvidos não detivessem um certo conhecimento "tecnológico" da matança proveniente da memória de rituais africanos trazidos pelos negros escravizados.


Tia Maruca explicou-nos também que o ritual é feito da meia-noite ao meio-dia, da chamada "hora grande" à "hora grande". Ao final, consagra-se o sacrifício aos deuses tocando-se o tambor, assim como descreveu Nicolau Dreys, um inglês que esteve em Pelotas por volta de 1839: "Na estação da matança, isto é, de novembro até maio, o trabalho das charqueadas principia ordinariamente à meia-noite, mas acaba ao meio-dia, e tão pouco cansados ficam os negros que não é raridade vê-los consagrar a seus batuques as horas de repouso que decorrem desde o fim do dia até o instante da noite em que a voz do capataz se faz ouvir." (Dreys, Notícias Descritivas, 1839, p.202-205).

Aquarela de Wendroth intitulada dança dos negros em Pelotas, de 1857.

Publicado por Sérgio Valentim
Fotos: Leandro Anton/Quilombo do Sopapo

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Pássaro Azul, o maior tocador de sopapo de Rio Grande


A Catarse esteve em Rio Grande e entrevistou a Poróca, filha do Pássaro Azul e o tio Valter, primo do passáro, com 80 anos, que tocou com ele no carnaval. Adão, o Pássaro Azul, foi o mais conhecido tocador de sopapo de Rio Grande. Tocava nas mariquitas, uma das primeiras escolas de samba do estado, o tambor de sopapo. Segundo o tio Valter, só ele que tocava naquele instrumento, pois tinha uma habilidade e fazia a diferença no som da escola. "Era possível ouvir de longe o sopapo do Pássaro quando a escola vinha chegando", segundo o primo que tocava prato junto dele. Era um negro de 2 metros de altura que travava duelos com o Boto, tocador de sopapo da Academia do Samba de Pelotas. Era comum naquela época, as escolas de Rio Grande desfilar em Pelotas.

fotografia de Passáro Azul (alto à direita) com a família

Poróca nos contou que o sopapo Rio Grande era feito com as madeiras provenientes de barris, como os de vinho, que era comum na cidade portuária. Ele era como uma grande cubana, ou um grande atabaque, feitos por um taloeiro e preso com tiras de ferro. Mas era maior que estes tambores tradicionais, tinha mais de um metro de altura e, segundo o tio Valter, a boca era grande e o som era extremanmente grave.



Publicado por Sérgio Valentim
Fotos: Leandro Anton/Quilombo do Sopapo

segunda-feira, 10 de maio de 2010

A Igreja de Oxum em Rio Grande



O projeto Tambor de Sopapo desenvolvido pelo Coletivo Catarse entrevistou Maria da Graça Amaral, que participou do projeto Cabobu e recebeu um dos quarenta sopapos produzidos pelo mestre Baptista durante o projeto. Maria da Graça esta concluindo o curso de serviço social e trabalha no acolhimento de estudantes estrangeiros provenientes dos países africanos de língua portuguesa, como Guiné Bissau, San Tomé e Principe, Moçambique e Angola, que procuram a Universidade de Rio Grande para estudar.Durante toda a faculdade pesquisou sobre o preconceito e a discriminação social sofridos pelos negros no sul do Brasil e que ainda persiste.




Maria da Graça contou que esta Igreja da Nossa Senhora da Conceição dos Negros foi fundada por uma irmandade de escravos libertos para que pudessem rezar separado dos Brancos.Explicou que esta irmandade se encontrava, por volta de 1808 no fundos da Igreja São Pedro, que é uma das igrejas mais antigas do Estado com 250 anos. Logo depois, em 1814 fundaram a igreja dos negros, com uma clara referência a OXUM, pois com a ditadura dos católicos, os africanos escravizados sincretizaram a deusa dos rios e cachoeiras em Nossa Senhora da Conceição, para que pudessem rezar e serem aceitos na sociedade.



Segundo Graça, a falta de referência aos escravos que criaram a irmandade que ajudou na construção da Igreja é devido a falta de conhecimento da comunidade sobre a sua própria história e que "quase ninguém sabe que ela foi fundada pelos negros". Mesmo assim, sempre no dia 08 de dezembro, que é dia de Nossa Senhora da Conceição, acontece uma comemoração na cidade onde a comunidade do candomblé entra na igreja e faz suas oferendas a Oxum, que nada mais é do que a Nossa Senhora da Conceição dos negros.



Públicado por Sérgio Valentim
Fotos: Gustavo Turck/Coletivo Catarse e Leandro Anton/Quilombo do Sopapo

sexta-feira, 7 de maio de 2010

O mercado de escravos em Rio Grande - RS

O Coletivo Catarse está em Rio Grande desenvolvendo o Projeto Tambor de Sopapo e entrevistou André Brisolara no mercado do peixe onde era feito o comércio de negros escravizados na época das charqueadas. A maioria destes escravos chegava pelo porto de Rio Grande e eram acorrentados nas colunas do mercado para serem expostos à venda.



André nos contou que os escravos eram lavados ali em frente e acorrentados nestas argolas, onde ficavam em exposição para o comércio. Uma legítima feira de escravos no tradicional mercado público de Rio Grande.







Publicado por Sérgio Valentim
Fotos: Leandro Anton/Quilombo do Sopapo